23 março 2007

Diário do melhor dia da minha vida

Saio da automotora, desço para a plataforma.
Vazia.
Estou em Alfarelos.
Não disse uma palavra desde que parti, sinto-me parcialmente paralisado.
O dia de hoje atingiu-me com a força de um murro e deixou-me seguir viagem.
Não há muitos dias assim.
Caminho um pouco, sento-me num banco.
Estou em Alfarelos, ali, no meio do nada.
Não consigo construir um pensamento lógico,
A minha mente interrompe-se constantemente.
Sinto-me a pessoa mais feliz do mundo.
Eu sou a pessoa mais feliz do mundo.
Eu disse que a amava. Disse que a amava.
Assim...
Podia jurar que estou a pairar, que só não o faço porque não me apetece.
Daria demasiado nas vistas.
Estou em Alfarelos. Nunca estive, não conheço, mas estou aqui. Hoje.
O Alfa Pendular rompe por momentos as fracas linhas de raciocinio.
Pela primeira vez sei que não sei o que vem a seguir
E sinto-me tão bem...
Podia morrer, aqui, sozinho
Nesta estação, neste banco, com todo este frio...que morria feliz.
A pessoa mais feliz do mundo.
Não tenho mais nada para fazer.
Já me perdi em inumeros esboços de sorrisos estupidos.
Em breve deixarei Alfarelos, precisamente no lugar onde o encontrei.
No comboio estico as pernas no banco da frente e tento não adormecer.
A realidade está a 200km daqui, como sempre.
O barulho das travessas é o meu companheiro de viagem.
Como se guarda um sonho?
A sério, como?
Lisboa está igual, iluminada por uma noite comum.
Já a vida está diferente,
Como uma tarde de verão ao pôr do sol
Com tudo a que se tem direito num dos melhores dias da nossa vida.
A vida...
A vida vale por dias assim.
Como se guarda um sonho?
Preciso de guardar um sonho.
Um dia, este dia. Hoje. Ela.
Alguem me diz como guardar um sonho?
Com todos aqueles pormenores que nos fazem rir.
Quero guardá-lo assim.
E sentir-me a pessoa mais feliz do mundo.
Porque fui.
E porque sou sempre que me lembro.

Em Alfarelos nada de novo.
Mas aqui está sempre aquele sorriso.
Obrigado.

É a isto que sabe a liberdade.